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Reumatologia

Tema: Espondilite Anquilosante

Por Dra. Gisele Martins

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Viva Mais Viva Melhor – Você já ouviu falar em espondilite anquilosante? Este nome estranho refere-se a uma doença que pode atingir cerca de 1 a cada 100 pessoas e afeta 3 vezes mais homens que mulheres, surge normalmente entre os 20 a 40 anos. Ela é um tipo de inflamação que atinge a coluna e as grandes articulações. Embora não exista cura se tratada precocemente é possível estagnar a progressão da doença e manter a mobilidade articular e a postura ereta. Quem conversa conosco sobre o assunto é a médica Gisele Martins, especialista em reumatologia.

Doutora, primeiramente explica para os nossos ouvintes o que é a espondilite anquilosante e por que que ela acontece?
Dra. Gisele Martins – A espondilite anquilosante é uma doença inflamatória crônica de origem autoimune e progressiva que afeta as articulações da coluna e as grandes articulações como os quadris, joelhos, tornozelos e ombros. Normalmente essa inflamação inicia-se nas articulações sacroilíacas, que é um segmento abaixo da coluna lombar, e tende a acender até a coluna cervical, causando a perda da mobilidade de toda extensão da coluna devido a fusão ou anquilose das vértebras, por isso o nome espondilite anquilosante.

Viva Mais Viva Melhor – E o que causa a espondilite anquilosante?
Dra. Gisele Martins – Como a maioria das doenças de origem autoimune, a causa ainda é desconhecida. Mas existe uma relação entre uma predisposição genética e o aparecimento da doença, ou seja, indivíduos que herdam o marcador genético chamado HLA-B27 está 300 vezes mais suscetível a desenvolver a doença do que o indivíduo que não possui. Existe ainda uma associação das doenças inflamatórias intestinais e a psoríase que é uma doença de pele com o aparecimento da espondilite anquilosante.

Viva Mais Viva Melhor – E quais são os principais fatores para o desenvolvimento da espondilite anquilosante?
Dra. Gisele Martins – Em primeiro lugar é ser do sexo masculino, uma vez que a doença afeta 3 vezes mais homens do que mulheres. Um outro fator de risco é ser adolescente ou adulto jovem que é a faixa etária de acometimento da doença e por último ter herdado o marcador genético HLA-B27, mas o marcador genético não quer dizer que obrigatoriamente a pessoa vai desenvolver a doença, a importância de saber se o paciente tem esse marcador genético é mais para o prognóstico da doença, porque a presença dele gera uma doença mais agressiva.

Viva Mais Viva Melhor – Doutora, quais são os riscos de filhos de pacientes com a espondilite anquilosante também apresentarem a doença?
Dra. Gisele Martins – Os riscos dos filhos de pacientes com a espondilite apresentarem a doença são muito reduzidos, não é mais do que 15%, se a gente for comparar as chances de 85% das crianças nascerem saudáveis, então o risco é muito pequeno. É muito comum os pais que têm a doença perguntarem se os filhos precisam fazer o exame para detectar o HLA-B27 e a gente sempre explica que não, não precisa porque a gente não tem como saber se a criança tem o marcador genético vai desenvolver a doença.

Viva Mais Viva Melhor – E quais são os sintomas da espondilite anquilosante?
Dra. Gisele Martins – Os sintomas vão desde os sintomas constitucionais que são os sintomas comuns a todos os quadros inflamatórios como febre baixa, fadiga, perda de peso, até os sintomas mais específicos da doença que são as manifestações articulares, cuja as mais comuns são a dor lombar ou dor nas regiões nas nádegas que normalmente se manifesta por mais de 3 meses, dor e inchaço nas grandes articulações como a gente falou e a rigidez matinal que é o desconforto articular pela manhã.

Viva Mais Viva Melhor – E os órgãos e tecidos que podem ser afetados pela doença, quais são doutora?
Dra. Gisele Martins – As articulações, que são os locais mais afetados que a gente acabou de falar, mas também o processo inflamatório pode afetar outros órgãos, gerando as manifestações extra-articulares da doença, como é o caso do acometimento ocular, que a gente chama de uveíte que é a inflamação do olho, se manifesta clinicamente pelo olho vermelho, é muito desconfortável para o paciente. O pulmão é outro local que pode ser acometido, onde a inflamação pode gerar fibrose pulmonar. E o acometimento cardíaco envolvendo a válvula aórtica, levando ao caso de insuficiência aórtica.

Viva Mais Viva Melhor – Como é que se diagnostica a espondilite anquilosante?
Dra. Gisele Martins – O diagnóstico é baseado no conjunto de sintomas, principalmente os sintomas articulares e é muito importante aí a gente caracterizar o tipo de dor lombar que esse paciente queixa para a gente, a anamnese bem detalhada destes sintomas. Uma outra forma de diagnosticar é fazendo um exame físico para testar a mobilidade da coluna e das articulações. Por último a gente tem os exames complementares, tanto laboratoriais na procura de evidências de inflamação e pesquisa do marcador genético, quanto de exames de imagem com os raios-X de coluna ou a ressonância nuclear magnética nos estágios mais avançados da doença.

Viva Mais Viva Melhor – E como que se diferencia a espondilite anquilosante de outros problemas de coluna como dores lombares ou dores na cervical?
Dra. Gisele Martins – Essa pergunta é muito importante, Olga. Lembra que eu falei que a dor lombar tem que ser muito bem caracterizada? Porque a dor lombar é uma das queixas mais comuns nos consultórios e na maioria das vezes a causa dessa dor lombar é mecânica, é por distensão, contraturas musculares, hérnias de discos e alterações degenerativas em que esse tipo de dor piora os movimentos, diferente da dor lombar da espondilite anquilosante que é uma dor do tipo inflamatória, ou seja, ela piora muito em repouso. Normalmente o paciente é acordado durante a noite pela dor, relata que precisa se levantar e andar para a dor aliviar um pouco, por isso a importância da caracterização da dor lombar, para começar a pensar na doença e investigar o mais precoce possível.

Viva Mais Viva Melhor – Falando em precocidade é possível fazer um diagnóstico precoce no caso da espondilite anquilosante seguindo todos estes protocolos que a senhora acabou de citar, doutora?
Dra. Gisele Martins – Sim, é possível, isso é muito importante, mas infelizmente não é o que a gente vê na prática. Os pacientes chegam muito tarde no especialista, muito tempo após o início dos sintomas, porque na maioria das vezes eles são tratados por uma dor lombar do tipo mecânica e só mais tarde por não melhorar são encaminhados ao reumatologista ou os próprios pacientes procuram um reumatologista.

Viva Mais Viva Melhor – E como a espondilite anquilosante pode progredir? Como é o quadro de uma fase mais avançada do problema?
Dra. Gisele Martins – A doença pode tanto se manifestar de uma forma branda, com dores leves nas costas e desconfortos articulares (e isso a gente vê muito em mulheres), como ela pode progredir causando a perda de toda a mobilidade da coluna, o paciente tem uma dificuldade de movimento muito grande nesta fase, a flexão da coluna é toda comprometida. 

Viva Mais Viva Melhor – Portanto a espondilite anquilosante certamente pode prejudicar a vida profissional do paciente, não é? O quê que ele poderia fazer para se prevenir, por exemplo, de problemas posturais no trabalho?
Dra. Gisele Martins – Sem dúvida nenhuma! Se a doença já gerou um quadro de anquilose que é a fusão das vértebras da coluna e a profissão dele exigir muita mobilidade, fica claro que o trabalho vai ficar muito prejudicado, assim como a sua qualidade de vida. Então, no trabalho, é fundamental que o ambiente de trabalho deste paciente seja um ambiente ideal com mesas e cadeiras apropriadas, ele sempre tem que alternar de ficar em pé, sentado, caminhar. Mas na maioria das vezes o que a gente sempre pede é que tenha consciência de manter uma postura adequada e isso é o que precisa ter para ter uma qualidade de vida nos casos dos pacientes com espondilite anquilosante.

Viva Mais Viva Melhor – Bom, doutora, em termos de tratamento, como é o tratamento da espondilite anquilosante? 
Dra. Gisele Martins – O tratamento não tem cura, ele vai objetivar o alívio dos sintomas e a melhora da qualidade e mobilidade da coluna permitindo uma qualidade de vida tanto profissional quanto social. O tratamento vai englobar o uso de medicamentos, fisioterapia, correção postural, exercícios que devem ser adaptados para cada paciente. Em relação aos medicamentos os que se usam são os anti-inflamatórios, mas caso os pacientes não tolerem isso a gente vê muito o uso de anti-inflamatório por um período longo o paciente não tolera e a gente precisa mudar. Hoje a gente tem um medicamento que são os imunobiológicos que têm sido muito eficazes, tanto nos sintomas quanto no controle da atividade da doença.

Viva Mais Viva Melhor – É importante exercícios físicos para a espondilite anquilosante, doutora? O paciente pode, por exemplo, praticar algum tipo de esporte?
Dra. Gisele Martins – Os exercícios físicos são fundamentais, faz parte do tratamento e o propósito é fortalecer a musculatura e manter a consciência da postura. O que se recomenda muito é a natação, que é um esporte de muito movimento, estimula o alongamento muscular, de pouco impacto porque é realizado na água. Uma outra atividade é o pilates que é muito recomendado também. O que não se recomenda são os esportes de contato, como as lutas marciais, por exemplo.

Viva Mais Viva Melhor – No caso de cama e colchão do paciente deve ser especial, deve ser adaptado?
Dra. Gisele Martins – O que a gente recomenda é sempre um colchão firme e sem depressões. Isso o paciente vê mesmo na prática que um colchão firme e sem depressões dá um conforto maior para ele. Tem paciente que relata para a gente que prefere deitar no chão exatamente por isso, por ser mais firme.

Viva Mais Viva Melhor – Paciente com espondilite anquilosante não sendo tratado pode perder toda sua mobilidade?
Dra. Gisele Martins – Infelizmente pode Olga, a doença na maioria das vezes é progressiva, se não tratada o paciente perde toda mobilidade da coluna, adquire uma postura que a gente chama de postura de esquiador, flete o tronco todo para frente, anterioriza o pescoço, perde os movimentos de rotação do pescoço, ele girar o pescoço tem que girar todo o tronco junto, como se fosse um robô.

Viva Mais Viva Melhor – Para finalizar, doutora, tem como prevenir a espondilite anquilosante? 
Dra. Gisele Martins – Infelizmente não. Não existe prevenção para este tipo de doença, uma vez que a gente não sabe quem vai desenvolver a doença. O que a gente sempre recomenda de uma forma geral para todos os pacientes é o cuidado com a postura e a prática da atividade física para o fortalecimento muscular e o diagnóstico precoce.

Viva Mais Viva Melhor – Ok. Conversamos com a médica Gisele Martins, especialista em reumatologia. Doutora, muito obrigada e até a próxima.