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Mitos e Verdades – Cirurgia Bariátrica

Por Dr. Marcelo Falcão

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Olga Goulart – A cirurgia bariátrica vem sendo apresentada em algumas situações como a solução ideal para os casos de obesidade mórbida. Porém, a técnica, que tem o objetivo de diminuir o tamanho do estômago do paciente, deve fazer parte de um programa que envolve mudança de hábitos, reeducação alimentar e atividade física. Além disso há outras questões que devem ser levadas em conta antes de encarar a mesa de cirurgia. Para responder as dúvidas sobre este tema na nossa série Mitos e Verdades, quem conversa conosco hoje é o médico Marcelo Falcão, especialista em cirurgia bariátrica.

Doutor, é mito ou é verdade que somente os obesos mórbidos podem fazer a cirurgia bariátrica?

Dr. Marcelo Falcão – Não, isso é mito. A verdade é que os obesos mórbidos têm indicação direta, mas existem os obesos que nós chamamos grau II, são pacientes que tem obesidade associada a doenças que chamamos de comorbidades, por exemplo o diabetes, hipertensão, apneia do sono, entre outras doenças. Então não são apenas obesos mórbidos que podem realizar a cirurgia bariátrica.

Olga Goulart – Os pacientes operados deverão continuar a fazer dieta após a operação, essa afirmativa é mito ou é verdade? 

Dr. Marcelo Falcão – A dieta é verdade, mas a dieta durante os primeiros 6 meses da cirurgia e aí o paciente é liberado. Durante estes 6 meses a dieta tem o objetivo de reeducar o paciente. O paciente operado vai ter alta depois dos 6 meses e aí ele segue com uma reeducação alimentar, não é dieta. Ele vai poder provar sabores, comer um mocotó, sarapatel da nossa terra, mas vai ter a educação de comer em volume menor, então não é uma dieta eterna, é uma dieta num período determinado a fim de reeducar o seu hábito alimentar.

Olga Goulart – É importante o acompanhamento psicológico antes e depois da cirurgia, mito ou verdade? 

Dr. Marcelo Falcão – Verdade, muito verdade isso. O acompanhamento psicológico é um pilar importante no tratamento da obesidade, da cirurgia bariátrica principalmente porque existe uma mudança da estética, uma mudança do corpo da pessoa e a cabeça tem que acompanhar esta mudança. É sabido por todos que a obesidade não é uma doença apenas mecânica, não é só o comer muito é o desejar muito também. A saciedade, a gula, passa por uma questão psicológica importante e a psicologia é fundamental para um tratamento adequado. Então o paciente é avaliado pré-operatoriamente pelo psicólogo, eles podem determinar algumas seções pré-operatórias e no pós-operatório existe um segmento e o paciente segue com o psicólogo ou o da clínica que ele realizou ou o psicólogo dele, mas é importante ter esse apoio psicológico porque as transformações principalmente nos dois primeiros anos são muito exacerbadas, podem realmente tumultuar um pouco a vida e a cabeça desse paciente.

Olga Goulart – A mulher que já fez redução do estômago não pode engravidar, isso é verdade ou é mito? 

Dr. Marcelo Falcão – Mito, mito. A gravidez ela é realmente liberada com um período que você tem que segurar, você não pode engravidar nos primeiros 2 anos, é o ideal. Por que não pode? Não é ‘não pode e pronto’, não pode porque você está vendo a transformação no seu organismo e você está se reinventando quanto ao organismo mesmo, quanto a nutrição, quanto a alimentação. Então você não pode gerar uma vida em que a mãe dá sustentação ou nutrição para o bebê. Se a mãe não tiver bem como é que vai gerar um bebê com uma condição ideal boa, um bom organismo? Então nós aconselhamos, existem casos que realmente saem do controle, mas o ideal é após 2 anos, você já tem uma estabilidade do seu peso, você já tem a estabilidade da sua rotina de alimentação e principalmente a distribuição nutricional dos nutrientes no corpo e eletrólitos, enfim, um estado nutricional adequado e estabilizado para uma gestação segura, isso é mais importante de ser dito. Que pode engravidar pode, agora não tem a segurança de 2 anos como realmente deve ser.

Olga Goulart – Perde-se mais peso nos primeiros 6 meses após a cirurgia bariátrica, isso é verdade ou é mito?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é verdade. Nos primeiros 6 meses é uma transformação muito grande, principalmente nos pacientes superobesos. Nós temos relatos e vivemos isso no nosso consultório, temos a experiência de pacientes com 6 meses perder 50kg, 50kg é uma pessoa, tem muita gente que pesa 50kg e a transformação corporal é muito grande. Após estes 6 meses, o primeiro ano é muito importante, mas os 6 meses é mais evidente e visualiza isso. No nosso segmento 1 ano, 2 anos, até 2 anos a perda de peso é bem importante, mas os 6 meses é o “tchan” da transformação do paciente, isso é verdade.

Olga Goulart – O paciente que fez redução de estômago pode engordar novamente, isso é verdade ou é mito? 

Dr. Marcelo Falcão – Verdade. E hoje é o principal problema da Sociedade Mundial de Cirurgia Bariátrica, é o reganho de peso do paciente operado. Muitas vezes não temos mais o que fazer porque a obesidade não tem cura, isso já conversamos antes. A obesidade ela tem um controle através da cirurgia. Se o paciente não mudar seus hábitos de vida, que passam por sair do sedentarismo, dieta, enfim, todos estes pilares, você não vai conseguir manter a perda de peso que você conseguia no primeiro momento com a cirurgia. Se ele opera e volta a comer uma dieta hipercalórica, volta a ficar sedentário, isso vai causar a obesidade nele porque ele tem a genética da obesidade.

Olga Goulart – Depois da operação, doutor, é comum a intolerância ao leite, isso é mito ou é verdade?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é mito, não é uma regra. Existem as pessoas que têm intolerância ao leite ou a lactose, isso pode acontecer, mas não é regra. A maioria dos pacientes, graças a Deus, toleram bem o leite e comem queijo, enfim, leite e derivados sem nenhum problema, isso é mito.

Olga Goulart – O risco de anemia e déficit nutricional é comum entre os pacientes, isso é mito ou é verdade?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é verdade, é o que havíamos falado da gestação. No primeiro momento a transformação do corpo, a restrição alimentar, as trocas metabólicas são alteradas e isso causa realmente uma anemia, existe uma necessidade de repor no primeiro momento, mas é tranquilamente corrigida ao longo dos primeiros 6 meses, deste primeiro ano. Existe na mulher uma preocupação maior no período da dismenorreia, você tem a menstruação como um fator de hemorragia e isso pode prejudicar um pouco mais, mas dá para corrigir tranquilamente. Existe sim uma percentagem importante em que é acompanhada por conta desta anemia, desta restrição alimentar, por conta do acesso a uma boa comida, também é importante que se diga isso. Mas isso não é mito, isso é verdade, o risco de anemia é ainda um índice alto na cirurgia bariátrica.

Olga Goulart – Doutor, é mito ou verdade dizer que a cirurgia plástica pós-bariátrica é um procedimento indispensável?

Dr. Marcelo Falcão – Indispensável é mito, ele é dispensável. Existem pessoas jovens quando nós operamos jovens que a reconstituição do corpo após a perda do excesso de peso não há necessidade de cirurgia plástica. Porém para os grandes obesos, principalmente com um volume abdominal fora do padrão, aqueles abdomes grandes e globosos, isso fica um excesso de pele que é realmente necessária a cirurgia plástica. Graças a Deus os convênios vem cada dia mais aceitando isso, com uma perícia obviamente, e tirando este excesso de pele que também é prejudicial ao paciente, mas não é indispensável a todos, nem todo operado vai fazer cirurgia plástica não.

Olga Goulart – Os planos de saúde e o SUS devem cobrir a cirurgia bariátrica e os procedimentos reparadores, isso é mito ou é verdade?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é um sonho. Isso é um sonho, mas não acontece dessa forma organizada, porque a cirurgia bariátrica principalmente no SUS não é só a cirurgia, você tem o psicólogo, você tem o cirurgião plástico, você tem a nutricionista e operar o paciente é o mais fácil, mas o SUS tem que montar uma estrutura para toda essa cadeia multidisciplinar funcionar e dar este respaldo ao paciente. Operar simplesmente eu acho errado, mas hoje isso não acontece. No plano de saúde (privado) não é um acesso tão fácil, mas é mais facilitado que o SUS obviamente, mas existem alguns percalços principalmente com as cirurgias reparadoras, como havíamos dito há pouco. 

Olga Goulart – Só existe um tipo de cirurgia para reduzir o estômago, isso é mito ou é verdade?

Dr. Marcelo Falcão – Mito! Nós temos hoje no Conselho Federal de Medicina regulamentado pelo menos 4 tipos de cirurgia para reduzir o estômago e uma que você coloca prótese de silicone chamada banda gástrica que tem sido feito pouco no Brasil, mas está regulamentada no Conselho Federal de Medicina. Atualmente usamos 2 tipos de cirúrgica que são a gastrectomia vertical, também conhecida como Sleeve e o famoso Bypass ou a cirurgia de Fobi-Capella, duas cirurgias consagradas que têm sido mais usadas aqui no nosso meio na Bahia e no Brasil em geral.

Olga Goulart – A cirurgia bariátrica é mais arriscada que outras cirurgias, doutor, isso é mito ou é verdade?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é mito. Porque a cirúrgica bariátrica é uma cirurgia realizada desde 1962 quando o doutor Mason fez a primeira gastrectomia vertical. A cirurgia bariátrica é uma cirurgia que mexe com um órgão que já se opera por muito tempo, se operou muito por úlcera fazendo essa cirurgia que nós fazemos hoje pela bariátrica, a diferença é que o estômago ficava muito maior do que nós deixamos hoje. A cirurgia bariátrica tem um componente de risco porque o paciente é um paciente de risco, mas é um risco que é comparado a uma cirurgia ortopédica num idoso ou uma cirurgia cardíaca e hoje a cirurgia cardíaca se opera minimamente evasiva. Então não é uma cirurgia mais arriscada ou não, o paciente que tem em qualquer cirurgia as suas comorbidades, as suas doenças associadas que podem levar a um risco maior ou menor. Isso é mito, a cirurgia bariátrica não é mais arriscada que qualquer outra. 

Olga Goulart – As unhas podem ficar quebradiças, bem como o cabelo pode cair após a cirurgia bariátrica, essa afirmativa é verdadeira ou é falsa?

Dr. Marcelo Falcão – Verdadeira. E nos reporta a situação da gestação que eu havia falado, a anemia. É uma mudança e a transformação, existe uma restrição de proteína inicialmente, você tem um balanço de proteína que você precisa equilibrar, por isso que no primeiro ano e no segundo ano você tem que ter um acompanhamento de perto, uma mudança nutricional boa e aí evitar realmente a gravidez, corrigir as anemias e aí as unhas e cabelos caem porque são derivados de proteína e se a proteína está baixa você tem essa perda e isso é verdade e muito comum. Para o nosso desespero as mulheres chegam nos consultórios totalmente infelizes com isso.

Olga Goulart – É verdade, doutor, que caso o paciente não esteja no peso recomendado para realizar o procedimento, engordar mais seria o melhor caminho, isso é verdade ou é mito?

Dr. Marcelo Falcão – Isso é mito! Olga, você não pode adquirir doença para usar medicação, para ser tratado. Isso é incoerência. Sabemos que existem algumas situações desta natureza, mas isso não pode ser incentivado, isso é contrário. Você não pode ficar doente para requerer um tratamento. Pelo amor de Deus, isso é um caminho inverso. Se você já está com excesso de peso trate o excesso de peso, não chegue na obesidade, se está na obesidade I trate a obesidade I, venha para o sobrepeso, objetivando um peso estável. Nunca se deixar ou querer engordar para se submeter a uma cirurgia, seja ela bariátrica ou de qualquer outro tratamento. Cirurgia é para uma doença e se você quer adquirir doença alguma coisa está errada com sua cabeça.

Olga Goulart – Muito bom! A gente tira todos os mitos em torno deste assunto. Conversamos com o médico Marcelo Falcão, especialista em cirurgia bariátrica, muito obrigada, doutor e até a próxima oportunidade.