Nossas Entrevistas

Cardiologia e Ergoespirometria

Tema: Atividade física e colesterol

Por Dr. Luiz Eduardo Ritt

Olga Goulart – Você sabe qual a hora certa de iniciar o tratamento medicamentoso para controlar o colesterol? Para a grande maioria da população, antes de apelar para as medicações, a melhor estratégia para acabar com os altos níveis de colesterol é a mudança no estilo de vida. Mais que um tratamento, viver de maneira saudável é fundamental para o bom funcionamento do corpo. Dentre as mudanças, iniciar uma atividade física é tão importante quanto o uso das medicações e a própria dieta. Mas, ainda há muitas dúvidas que envolvem o colesterol e a atividade física. Para saber um pouco melhor sobre este assunto, sobre essas dicas de como se prevenir contra a doença, quem conversa conosco hoje é o especialista em cardiologia, doutor Luiz Eduardo Ritt, que vai esclarecer as principais perguntas.

Doutor, vamos explicar para os nossos internautas quais as causas e consequências da elevação do colesterol no organismo?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Oi Olga. Este assunto é realmente de muito interesse. O colesterol é um dos grandes vilões que podem levar ao infarto e ao AVC (Acidente Cerebral Vascular), por exemplo. Estudos clínicos internacionais já mostraram que o colesterol está entre os 3 principais fatores modificáveis relacionados ao infarto. E eu digo modificáveis porque é algo onde a medicina pode atuar e com certeza a partir daí modificar o prognóstico ou até o segmento deste paciente, mudando então a chance dele ter ou não infarto.

Olga Goulart – Qual o impacto da atividade física sobre as taxas lipídicas, o colesterol total, o LDL que é o colesterol ruim e o HDL que é o bom?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Excelente Olga. A atividade física regular é importante para tudo. A OMS (Organização Mundial da Saúde) coloca que a pessoa deve se exercitar ao menos 150 minutos por semana, o que não é muito difícil de se atingir. A atividade física vai levar principalmente ao efeito de elevação do HDL, o chamado colesterol bom e redução dos triglicérides, que também é uma outra forma que o colesterol circula no sangue. Os efeitos como o LDL, chamado colesterol ruim, existem, mas são efeitos mais modestos, mas é importante que se faça exercício físico para reduzir. Pode se dizer que consegue-se com dieta e atividade física, logo com essa dupla uma redução em torno de 15% do LDL. Então é uma redução significativa, mas além dos efeitos que existem do HDL, que é o colesterol bom, e na redução do triglicérides, principalmente para estes dois a atividade física e a dieta adequada são imprescindíveis. Mas temos que ressaltar que mesmo aqueles pacientes que precisam de uma medicação, não quer dizer que ele não precise fazer atividade física. Os estudos clínicos que analisaram os medicamentos para redutores de colesterol que demonstraram que essas medicações foram positivas em reduzir o colesterol e reduzir o infarto do miocárdio e o AVC, aqueles pacientes estavam como base do seu tratamento fazendo atividade física e tendo uma dieta adequada. Então essa é a base do tratamento. Costumo dizer que o paciente precisa ter um solo fértil. Esse solo fértil fazendo o dever de casa é o que? Fazer atividade física e fazer uma boa dieta. Se ele não fizer isso, nós médicos vamos ter que lançar mão de mais medicação do que o que seria necessário e isso nunca é o ideal.

Olga Goulart – Pacientes que usam medicações para o controle do colesterol, as famosas estatinas, doutor, também são beneficiados pela realização da atividade física?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Com certeza, essa sua pergunta também é muito importante. Passa muito na cabeça dos pacientes “olha, eu estou tomando meu remédio e eu estou protegido”, mas não é assim. Nós não podemos falar em medicina no que eu acho ou o que o colega acha, nós temos que basear nossa opinião em estudos clínicos, em pesquisa clínica publicada em revistas médicas de renome e de peso. E estudos mostram, por exemplo, que pacientes que usavam remédio de colesterol e foram estudados aqueles que faziam atividade física e tinham bons hábitos alimentares versus aqueles que também usavam o remédio de colesterol, mas não faziam atividade física, eram sedentários. E a atividade física levou a benefícios maiores naqueles pacientes, mesmo aqueles que já usavam medicação para o colesterol. Então é imprescindível que se deixe de ser sedentário.

Olga Goulart – Existe vantagem de algum tipo de exercício sobre o outro quanto a capacidade de melhorar os níveis de colesterol. Há alguma atividade que não deve ser considerada para este fim?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – A atividade física aeróbica é a base do condicionamento. Uma pessoa deve buscar pelo menos 150 minutos por semana de atividade física aeróbica. A atividade física chamada de exercício resistido com peso ela também é importante, mas principalmente para a melhoria da massa muscular, da massa óssea, mas para os efeitos no colesterol principalmente a atividade física aeróbica. E aí vai muito do gosto do freguês, se você prefere caminhar vá caminhar, se você prefere correr tudo bem, se você gosta de nadar, se você gosta de fazer um outro esporte coletivo como voleibol, basquete ou futebol, mas desde que seja algo com regularidade e que atinja este mínimo semanal. Exercícios então como caminhar, mas não é passear, tem que se exigir um pouco do corpo, uma forma simples de ver é caminhar e tentar falar ou cantar, você tem que ter alguma dificuldade para estar falando para que mostra que você está num nível de exercício adequado, este é o mínimo necessário. Quem quiser se aventurar em uma carga maior ótimo, os benefícios podem ser ainda maiores, mas o exercício aeróbico é a base deste tratamento. Não que os outros tipos de exercícios não sejam importantes, são, mas o exercício aeróbico é, sim o que tem melhores resultados.

Olga Goulart – Já que é tão importante a regularidade da realização de uma atividade física para o controle do colesterol, com que frequência o senhor recomendaria, uma frequência mínima semanal, para a pessoa realizar as suas atividades?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – 150 minutos por semana, que podem ser divididos em 3 ou 4. Não é difícil, 3 vezes de 50 minutos, ou 4 vezes de 30 a 40 minutos de exercício por semana e ele pode dividir entre os dias da semana e o fim de semana também. Então isso seria o basal.

Olga Goulart – Ok. Bom, feito isso doutor, em quanto tempo mais ou menos as pessoas podem ver resultados na alteração dos níveis de colesterol?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Os resultados já podem ser vistos ao longo de 90 dias após. A gente costuma, a nível de consultório, implementar as medidas não medicamentosas, por exemplo, e observar com 90 dias, ou seja, 3 meses, novos exames para checar se houve uma redução e qual redução foi essa. Vale ressaltar também, Olga, que esta resposta ela é muito individual. Nós temos pessoas que vão responder muito bem as medidas de atividade física e outros que são respondedores mais fracos. Muitas vezes chegam pacientes no consultório que ele já faz alguma coisa, já faz atividade física, tem uma dieta razoável e mesmo assim está com colesterol alto. Nesse, muitas vezes, ele já está fazendo a parte dele. Outras vezes o indivíduo chega, mas ele tem sobrepeso, ele é sedentário e ele tem mau hábito alimentar, este indivíduo não está fazendo o dever de casa dele.

Olga Goulart – Doutor Luiz, ao suspender atividade física perde-se todo o benefício adquirido?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Excelente pergunta, Olga. Perde-se sim. Isso não é um benefício mantido, para você ter este benefício você deve manter a sua regularidade. Estudos que foram realizados com pacientes cardiopatas, pacientes que tiveram um infarto, que se engajaram por exemplo em programas de reabilitação cardiovascular, que são programas específicos em locais com equipes especializadas de fisioterapeutas, educadores físicos e médicos, por exemplo, para acompanhar pacientes de alto risco, mas que devem também se beneficiar do exercício. E aí se analisou pacientes ao longo do tempo e comparou aqueles que continuavam com aqueles que paravam, e aqueles que pararam, depois de 3 meses, tinham uma perda praticamente a situação dele basal, do que antes de fazer exercício. Então o exercício deve ser mantido ao longo do tempo.

Olga Goulart – É preciso acompanhamento de um educador físico orientando quanto a intensidade e o descanso para garantir a segurança do paciente e a eficácia da atividade, doutor, ou não necessariamente?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Idealmente sim, Olga. Vamos colocar na seguinte situação, o indivíduo que quer intensificar este obrigatoriamente e idealmente tem que ter um educador físico para evitar principalmente lesões, para evitar que você faça exercício além do esperado para sua capacidade e que fique fora de faixas de risco, porque o exercício em excesso também pode trazer risco e não é bom. É igual a medicação, a medicação em dose abaixo da necessária não vai fazer bem e acima da necessária vai fazer mal. Então existe a dose certa de exercício para cada pessoa. Uma pessoa que não tem nenhum problema cardíaco essa dose é muito variável, mas uma pessoa que tem algum fator de risco, algum problema, alguma situação já cardíaca essa dose já vai ser mais específica. Então o ideal é que tenha sim um professor de educação física orientando este indivíduo sempre que possível, seja na academia, seja no clube, seja como na forma dos personal trainers, o imprescindível e o ideal é que tenha um professor de educação física sim orientando ele nesses exercícios.

Olga Goulart – Alguns casos de morte súbita em academias, doutor, têm sido reportadas pela mídia com muita frequência. Para evitar este tipo de desfecho é importante uma avaliação cardiológica antes do início da atividade física?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Olga, primeiro, nós temos que partir do seguinte pressuposto, é muito mais comum uma morte súbita ou um infarto em quem não faz exercício do que em quem faz, porém quando ocorre em uma academia ou em alguma situação dessa um evento de morte súbita, ou um atleta morre durante uma prova, ou durante um jogo isso é muito relatado pela mídia e isso comove muito as pessoas, lógico. Mas é interessante que se faça uma avaliação médica antes de iniciar um programa regular de exercícios, isso por dois motivos. Primeiro, que as vezes nós podemos flagrar mesmo alguma questão cardiológica ou algum diagnóstico no indivíduo e que você possa dar o tratamento específico. Segundo, que este é o momento que a pessoa está ali para começar a fazer exercício, a maioria dessas pessoas estão buscando uma mudança no hábito de vida. Então é um bom momento para checar suas taxas de colesterol, para chegar como está sua glicemia, se ele está dentro das metas, estimar o risco cardiovascular daquele indivíduo, orientá-lo quanto a prevenção cardiovascular e também fazer uma avaliação pormenorizada, nossa Sociedade Brasileira de Cardiologia e sociedades internacionais tem hoje instrumentos já que nós podemos aplicar na história clínica do indivíduo, com pequenas perguntas rápidas, com exame físico direcionado e com eletrocardiograma nós resolvemos a maioria das questões e aí você pode selecionar pacientes que tinham alguma cardiopatia e poder orientá-los melhor e tirar da faixa de uma faixa de risco.

Olga Goulart – Algumas escolas estão solicitando atestados para liberação das crianças para realização da educação física. Essa é uma boa prática? Crianças também precisam ser avaliadas antes do início de uma atividade física seja ela curricular ou extracurricular, doutor?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Muito bom este questionamento, nós temos recebendo este tipo de situação no consultório e gostaria de aproveitar esta entrevista, Olga, para dizer que isso não é uma prática boa. As crianças na atividade física recreacional que elas fazem nas escolas elas estão tendo o primeiro contato com o esporte. Estas crianças não fazem ali um exercício de muito alta intensidade. O próprio educador físico tem como aplicar, por exemplo, um questionário básico e ver se a criança sente algo ou não, ou ele perceber se tem alguma criança que está cansando mais do que as outras e ele indicar que essa seja avaliada. Toda criança tem um pediatra, na grande maioria das vezes, então este pediatra avalia e escuta esta criança se ela tem alguma alteração cardíaca ele encaminha. Se a criança está bem, se a criança está brincando, se a criança está fazendo o seu exercício como as outras e não está saindo da média, se aquilo é uma atividade física recreacional. Agora, existem crianças hoje que já estão fazendo esporte competitivo, essas precisam ser avaliadas de uma forma mais específica, porque essas estão testando limites.

Olga Goulart – Ok. É necessário controlar a frequência cardíaca através daquele frequencímetro na realização da atividade aeróbica, doutor?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Nós temos várias fórmulas de controlar o nível da nossa atividade aeróbica, Olga. Você pode controlar simplesmente pela sua percepção do esforço, você faz uma escala de 0 a 10, onde 10 é o esforço máximo e 0 seria parado sem fazer nada e você trabalha em torno do 6, do 7 até o 8 em 10 em nível de cansaço. Você pode fazer o teste do falar, como eu comentei antes, durante o exercício e se você falar com um pouco de dificuldade, mas não tanto, está num nível bom ou você pode usar a frequência cardíaca. São métodos e vai depender do seu objetivo. Se um indivíduo está fazendo um tratamento mais pragmático, mais individualizado, ele vai usar a frequência cardíaca idealmente. Se o indivíduo está fazendo um exercício mais de lazer ou de condicionamento sem exigir tanto do seu corpo, não é obrigatório que se veja a frequência cardíaca, pela própria sensação do cansaço ele consegue se guiar. Isso tudo é para a gente não limitar. Não quer dizer que uma pessoa precisa ter um frequencímetro para fazer o exercício, a gente coloca empecilhos para o exercício e acaba tirando algumas pessoas que estavam bem-intencionadas de fazer exercício devido a utensílios que são colocados como ter um frequencímetro, então temos que ver tudo isso com muito bom senso.

Olga Goulart – Independente, doutor, do objetivo, ou seja, perder peso, deixar o sedentarismo ou melhorar os níveis de colesterol, qual o primeiro passo para quem quer iniciar uma atividade física?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – O primeiro passo é sair da inércia. O mais difícil é você começar algo. Lógico, se o indivíduo tem mais idade, se ele tem algum fator de risco, ou se ele pretende fazer uma atividade física de maior intensidade, ele vai procurar o médico antes, mas mesmo quando procura, uma prática que eu tenho é de falar “comece, comece com alguma coisa leve”, porque pegar aquele momento que a pessoa está disposta a sair do sedentarismo e começar com atividade física nós não podemos perder aquele momento, aquela janela de oportunidade em que nós podemos tirar o indivíduo do sedentarismo que é o maior fator de risco e colocarmos ele ativo. Lógico que não vamos fazer uma atividade física de alta intensidade sem fazer os exames todos antes. O indivíduo deve buscar seu médico, buscar sua orientação, se ele já tem alguma questão cardiológica nele mesmo ou em algum familiar próximo mais ainda essa avaliação médica é ainda mais indicada. Ele deve idealmente se ele vai fazer uma atividade física mais intensa buscar também um educador físico e aí ele se cerca de buscar só os benefícios da atividade física.

Olga Goulart – Bom, doutor, para finalizar, qual tipo, duração e frequência recomendada da atividade física quando se pensa em obter os melhores resultados?

Dr. Luiz Eduardo Ritt – Frequência, vamos falar assim do que é o mínimo a se fazer. Tipo, alguma atividade física aeróbica, seja caminhar, nadar, pelo menos 3 vezes semanais, se acumular aí pelo menos 150 minutos por semana. E a intensidade moderada é uma boa intensidade para a gente começar. Não há uma obrigatoriedade de fazer algo intenso para ter os benefícios do ponto de vista de saúde. Se você quer fazer algo intenso para desafiar os seus limites ou competir com outros, ótimo, vamos em frente, faça seus exames e se estiver tudo ok vamos, mas para os benefícios na saúde não é necessário muito mais do que os 150 minutos na semana.

Olga Goulart – Ok. Conversamos com médico Luiz Eduardo Ritt, especialista em cardiologia do Instituto Procardíaco. Doutor, muito obrigada, foi ótimo e até a próxima.